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Abordagem da hepatopatia alcoolica

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Mensagem  Tulio Henrique Versiani Sex maio 22, 2015 1:10 am


Abordagem do tratamento

O principal objetivo do tratamento em todos os pacientes é reduzir a lesão hepática, decorrente de uso excessivo do álcool, e prevenir a evolução da doença hepática. Outros objetivos do tratamento são: reduzir os sintomas e prevenir as complicações relacionadas à hepatopatia alcoólica. É importante que os clínicos considerem o manejo contínuo, em longo prazo, da hepatopatia alcoólica, além do tratamento dos episódios sintomáticos agudos da hepatite alcoólica. O tratamento por uma equipe multidisciplinar é a abordagem ideal. Um especialista médico (clínico, gastroenterologista ou hepatologista), um especialista em saúde mental (psiquiatra, especialista em abuso de substâncias) e um especialista em nutrição (nutricionista, gastroenterologista) devem trabalhar em conjunto para melhorar o prognóstico em longo prazo do paciente.
Mudanças no estilo de vida e manejo da abstinência alcoólica

A importância da abstinência de álcool deve ser enfatizada continuamente no manejo da hepatopatia alcoólica. Abstinência, ou até mesmo a redução da quantidade de álcool consumida, melhora a sobrevida estimada na hepatopatia alcoólica, mesmo na presença de cirrose com descompensação. A abstinência de álcool reduz esteatose, fibrose e, possivelmente, o risco de carcinoma hepatocelular. A abstinência de álcool também se mostrou benéfica para a sobrevida global da hepatite alcoólica aguda. [C Evidence]

No processo de instituição da abstinência de álcool, deve-se considerar a ocorrência da síndrome da abstinência alcoólica, como a ocorrência de sintomas neurológicos e psiquiátricos, manifestando-se primariamente como tremor nos membros, sudorese, alucinações, taquicardia, hipertensão e, até mesmo, convulsões. O tratamento com medicamentos sedativo-hipnóticos é indicado para pacientes com abstinência alcoólica. No entanto, em pacientes com cirrose, o uso de sedativos pode desencadear encefalopatia hepática. Uma abordagem mais cautelosa (por exemplo, oxazepam) se faz necessária para esses pacientes. Uma vez que a abstinência tenha sido atingida, uma combinação de aconselhamento e naltrexona ou acamprosato pode ser considerada para melhorar a probabilidade de abstinência em longo prazo.

Visto que a obesidade causa esteatose, esteato-hepatite e cirrose, a redução de peso é importante em pacientes obesos para retardar a evolução da hepatopatia alcoólica. Exibir imagemExibir imagem É necessário cautela se orlistate estiver sendo usado como agente redutor de peso na hepatopatia alcoólica devido à incidência, recentemente reportada, de insuficiência hepática aguda e outras complicações significativas, como colelitíase e hepatite colestática.

O abandono do hábito de fumar é benéfico na redução da evolução da hepatopatia alcoólica. O abandono desse hábito também é útil para iniciar e manter a abstinência de álcool. Ele pode ser facilitado por esforços simples como a mera recomendação de um clínico durante consultas de rotina com o paciente. [A Evidence]
Imunizações

A vacina pneumocócica e contra a gripe (influenza) é recomendada para pacientes com hepatopatia alcoólica crônica (assim como para pacientes com doenças crônicas em geral). Se os anticorpos de superfície da hepatite B e imunoglobulina G (IgG) da hepatite A forem negativos, a imunização contra hepatite A e B deve ser considerada em todos os estágios da hepatopatia alcoólica.
Nutrição

A prevalência de desnutrição é extremamente alta na hepatopatia alcoólica. A hepatopatia alcoólica está associada com um alto risco de complicações, inclusive infecção, ascite, encefalopatia, síndrome hepatorrenal e mortalidade global. A suplementação nutricional poderá ser benéfica para a redução da mortalidade global em certos pacientes desnutridos com hepatopatia alcoólica, especialmente os que apresentarem hepatite alcoólica ou cirrose. Prefere-se a nutrição enteral. Se o paciente não conseguir atingir por via oral uma ingestão calórica adequada, a nutrição enteral por meio de um tubo de alimentação poderá ser considerada. O uso de rotina de formulações especializadas não é indicado, salvo se formulações-padrão não puderem ser toleradas nas quantidades necessárias para atingir os requisitos nutricionais. Não se deve permitir que pacientes com cirrose fiquem longos períodos sem se alimentar. É necessário que se alimentem em intervalos frequentes, enfatizando um lanche noturno e alimentação pela manhã, para melhorar o equilíbrio de níveis de nitrogênio. Uma metanálise mostrou que a encefalopatia hepática pode ser melhorada com o fornecimento de suplementação nutricional a pacientes com hepatite alcoólica.

Uma terapia nutricional agressiva deve ser instituída durante períodos de hospitalização por descompensação aguda da hepatopatia alcoólica. Prefere-se a alimentação enteral em vez da alimentação intravenosa. A ingestão de proteínas é geralmente bem-tolerada e não há motivos para a restrição de proteínas de rotina para pacientes com hepatite alcoólica. A tiamina e outros suplementos vitamínicos deverão ser considerados, se necessário. Pacientes alcoólicos apresentam alto risco de evoluir para a "síndrome de realimentação" e devem ser estritamente monitorados quanto ao desenvolvimento de hipocalemia, hipofosfatemia e hipomagnesemia graves.
Farmacoterapia

Não há terapia aprovada para a hepatopatia alcoólica. Os ensaios clínicos tiveram como foco pacientes com hepatite alcoólica. Há diversos usos, avaliados por ensaio clínico randomizado e controlado (ECRC), para os corticosteroides em pacientes com hepatite alcoólica. Uma metanálise avaliou 15 ECRC e não observou mortalidade reduzida na avaliação global de pacientes com hepatite alcoólica. [56] Na análise de subgrupos, o uso de corticosteroides melhorou a sobrevida em curto prazo de pacientes com hepatite alcoólica grave com pontuação da função discriminante de Maddrey (MDF) igual ou superior a 32 ou com encefalopatia hepática; no entanto, não houve benefício à saúde em longo prazo. [MD+CALC: Maddrey's discriminant function calculator] (external link) A MDF baseia-se em uma pontuação composta de tempo de protrombina (TP) e bilirrubina total. Uma pontuação mais elevada indica um prognóstico pior. A pontuação da MDF >32 indicará alta mortalidade, de cerca de 35% a 45%. Pacientes com MDF <32 apresentam taxas de sobrevida em curto prazo de 90% a 100%. [60] Um declínio precoce na bilirrubina sérica, no 7º dia de tratamento, é um forte fator prognóstico de resposta a corticosteroides e uma taxa de sobrevida mais alta aos 6 meses após o tratamento. A importância do declínio precoce da bilirrubina como um marcador da melhora na sobrevida aos 28 dias foi confirmada em uma metanálise. Em pacientes que não apresentam uma diminuição da fibrose precoce, a mudança para pentoxifilina não será benéfica.A prednisolona é preferida em detrimento da prednisona para pacientes com hepatite alcoólica aguda, pois a prednisona é convertida em prednisolona no fígado. Corticosteroides devem ser evitados em pacientes com hepatopatia alcoólica e sangramento gastrointestinal que necessite de transfusão, infecção ativa e síndrome hepatorrenal. Em um ensaio clínico randomizado e controlado, a combinação de corticosteroides associados à N-acetilcisteína resultou em melhor sobrevida em 1 mês e taxas mais baixas de síndrome hepatorrenal e infecções, em comparação ao uso isolado de corticosteroides. No entanto, a mortalidade aos 6 meses foi a mesma em ambos os grupos.

Uma revisão Cochrane concluiu que o agente anti-TNF (fator de necrose tumoral) pentoxifilina apresenta um possível efeito benéfico na mortalidade por todas as causas e na mortalidade decorrente de síndrome hepatorrenal. No entanto, evidências de um efeito benéfico na ausência de síndrome hepatorrenal não são conclusivas. A pentoxifilina diminui o risco de síndrome hepatorrenal como causa de morte em pacientes com hepatite alcoólica aguda, mas não há dados sobre o uso de pentoxifilina na hepatopatia alcoólica crônica.Um ensaio clínico randomizado e controlado que comparou a monoterapia com corticosteroide com um tratamento combinado de corticosteroides associados a pentoxifilina, em 270 pacientes com hepatite alcoólica grave, não mostrou diferença entre as duas opções de tratamento.Um estudo piloto controlado e randomizado de 2011, em pacientes com cirrose e ascite com clearance da creatinina de 41-80 mL/minuto, avaliou a terapia com pentoxifilina em longo prazo. O estudo observou que no grupo da pentoxifilina, a pressão arterial média e o nível de creatinina melhoraram aos 3 e 6 meses enquanto, no grupo placebo, a pressão arterial média permaneceu inalterada e o nível de creatinina piorou aos 1, 3 e 6 meses. A síndrome hepatorrenal ocorreu em 10 dos 30 pacientes no grupo placebo e em 2 dos 30 pacientes no grupo da pentoxifilina, demonstrando que a terapia com pentoxifilina em longo prazo diminui o risco de síndrome hepatorrenal em pacientes a ela predispostos.

Não há dados suficientes para avaliar se outras terapias anti-TNF são benéficas na hepatopatia alcoólica. Propiltiouracila, colchicina, polienilfosfatidilcolina, lecitina, esteroides anabolizantes e vitamina E foram investigados e não demonstraram benefício algum. Portanto, eles não devem ser usados, salvo em ensaios clínicos.

Tratamento de hepatite C coexistente

A decisão de se empregar a terapia antiviral em pacientes com hepatopatia alcoólica e infecção por hepatite C deve ser determinada em cada caso. Determinou-se, através de limitados dados disponíveis, que o consumo ativo de bebidas alcoólicas pode reduzir a eficácia da terapia com interferona para infecção por hepatite C. Portanto, o uso em potencial de interferona ou outros agentes antivirais em pacientes apresentando abuso de álcool ativo não é recomendado de modo geral. A abstinência de álcool sucedida por terapia antiviral pode melhorar potencialmente a eficácia dessa terapia.

Tratamento da ascite

Os rins retêm sódio avidamente em pacientes com hepatite alcoólica e cirrose. O objetivo do tratamento é atingir o equilíbrio negativo de sódio. Pacientes com doença menos grave podem responder à restrição alimentar isolada de sódio (máx. 2 gramas de sódio por dia). Restrições mais intensas geralmente causam problemas de adesão terapêutica, pois a dieta se tornará desagradável e o paciente poderá reduzir a ingestão de alimentos. Apenas 10% a 15% dos pacientes respondem ao manejo alimentar isolado. Conforme a função hepática se deteriora, os pacientes precisam de diuréticos em conjunto com uma dieta restrita de sódio a fim de induzir a excreção adequada de sódio na urina. O esquema terapêutico diurético mais comumente usado é uma combinação de furosemida e espironolactona. Usando essa combinação, é possível atingir uma terapia bem-sucedida em até 90% dos pacientes. [78] Pacientes que forem refratários à restrição de sal e diuréticos (geralmente <10% dos pacientes com cirrose) poderão precisar de terapias com paracentese de grande volume ou anastomose portossistêmica intra-hepática transjugular (TIPS). Observou-se que o uso oral diário de fluoroquinolona em pacientes com cirrose hepática selecionados e de alto risco, com baixa proteína no líquido ascítico (<1.5 g/dL), reduziu o primeiro episódio de peritonite bacteriana espontânea (PBE) e a mortalidade, em uma metanálise recente. [80] A profilaxia primária com fluoroquinolona oral deve ser considerada em pacientes com cirrose alcoólica de alto risco e adequados (proteína no líquido ascítico <1.5 g/dL).

Doença em estágio terminal

Pacientes com hepatopatia alcoólica em estádio terminal devem ser considerados para transplante de fígado. Deve-se rastrear pacientes com hepatopatia alcoólica em busca de comorbidades relacionas ao álcool, e eles devem apresentar, ao menos, um período confirmado de 6 meses de abstinência.Portanto, os pacientes com hepatite alcoólica aguda geralmente não serão considerados para transplante até que tenham se recuperado da doença aguda e possam demonstrar reabilitação e abstinência sustentada.

A prioridade para o recebimento do transplante de fígado depende da pontuação MELD (Model End-Stage Liver Disease - modelo para doença hepática terminal). [Mayo Clinic: MELD model] (external link) Outros fatores incluem a intensidade da doença hepática, complicações associadas, outras comorbidades clínicas e psiquiátricas, apoio familiar, dependência alcoólica e risco de recidiva. O modelo baseia-se em uma pontuação composta por creatinina sérica, bilirrubina sérica e razão normalizada internacional (INR). Uma pontuação mais elevada indica um prognóstico pior. Ela foi validada como um preditor independente de sobrevida em pacientes candidatos ao transplante de fígado. A pontuação MELD de 21 apresentou sensibilidade de 75% e especificidade de 75% na predição de mortalidade aos 90 dias na hepatite alcoólica aguda.


Referencias:

World Health Organization. Public health problems caused by harmful use of alcohol: report by the Secretariat. Fifty-eighth World Health Assembly, Provisional agenda item 13.14. Geneva, Switzerland: WHO; 2005.

O'Shea RS, Dasarathy S, McCullough AJ; Practice Guideline Committee of the American Association for the Study of Liver Diseases; Practice Parameters Committee of the American College of Gastroenterology. Alcoholic liver disease. Hepatology. 2010;51:307-328.

BMJ :http://brasil.bestpractice.bmj.com/best-practice/monograph/1116/resources/references.html

dYNAMED: http://web.b.ebscohost.com/dynamed/detail?vid=4&sid=83174a2f-1bc8-42c7-a4fd-39cd9492b215%40sessionmgr115&hid=116&bdata=Jmxhbmc9cHQtYnImc2l0ZT1keW5hbWVkLWxpdmUmc2NvcGU9c2l0ZQ%3d%3d#db=dme&AN=113903

Tulio Henrique Versiani

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